1.
Hoje, as provas tradicionais perderam espaço para novas formas de avaliação.
Isso significa que elas devem deixar de existir ou devem dividir espaço com as
novas atividades?
A
questão básica é distinguir o que significam as provas e o que significa
avaliação. As provas são recursos técnicos vinculados aos exames e não à
avaliação. Importa ter-se claro que os exames são pontuais, classificatórios,
seletivos, anti-democráticos e autoritários;
a avaliação, por outro lado, é não pontual, diagnóstica, inclusiva,
democrática e dialógica. Como você pode ver, examinar e avaliar são práticas
completamente diferentes. As provas (não confundir prova com questionário,
contendo perguntas abertas e/ou fechadas; este é um instrumento; provas são
para provar, ou seja, classificar e selecionar) traduzem a idéia de exame e não
de avaliação. Avaliar significa subsidiar a construção do melhor resultado
possível e não pura e simplesmente aprovar ou reprovar alguma coisa. Os exames,
através das provas, engessam a aprendizagem; a avaliação a constrói
fluidamente.
2.
Li algumas reportagens que defendem que o estudante deve ser avaliado durante
todo o processo de ensino-aprendizagem. Mas como é esse trabalho?
O
ato de avaliar a aprendizagem implica em acompanhamento e reorientação
permanente da aprendizagem. Ela se realiza através de um ato rigoroso e
diagnóstico e reorientação da aprendizagem tendo em vista a obtenção dos
melhores resultados possíveis, frente aos objetivos que se tenha à frente. E,
assim sendo, a avaliação exige um ritual de procedimentos, que inclui desde o
estabelecimento de momentos no tempo, construção, aplicação e contestação dos
resultados expressos nos instrumentos; devolução e reorientação das
aprendizagens ainda não efetuadas. Para tanto, podemos nos servir de todos os
instrumentos técnicos hoje disponíveis, contanto que a leitura e interpretação
dos dados seja feita sob a ótica da avaliação, que é de diagnóstico e não de classificação.
O que, de fato, distingue o ato de examinar e o ato de avaliar não são os
instrumentos utilizados para a coleta de dados, mas sim o olhar que se tenha
sobre os dados obtidos: o exame classifica e seleciona, a avaliação diagnostica
e inclui.
...
6.
O que o professor precisa mudar na sua concepção de avaliação para desenvolver
uma prática avaliativa mediadora?
Necessita
de compreender o que é avaliar e, ao mesmo tempo, praticar essa compreensão no
cotidiano escolar. Repetir conceitos de avaliação é uma atitude simples e
banal; o difícil é praticar a avaliação. Isso exige mudanças internas do
educador e do sistema de ensino.
7.
Muito se fala sobre o futuro da avaliação, mas muitos educadores ainda não
mudaram a maneira de encarar o ensino e a aprendizagem. Mudar apenas a
avaliação não seria uma forma de mascarar o problema?
Se
um educador se propuser a modificar seu modo de avaliar, obrigatoriamente terá
que modificar o seu modo de compreender a ação pedagógica. A avaliação não
existe em si e por si; ela subsidia decisões dentro de um determinado contexto.
No nosso caso, o contexto pedagógico. Os exames são recursos adequados ao
projeto pedagógico tradicional; para trabalhar com avaliação necessitamos de
estar vinculados a um projeto pedagógico construtivo (o que não quer dizer
construtivista ou piagetiano; segundo esse meu modo de ver, nesse caso, a
pedagogia do Prof. Paulo Freire é construtiva, trabalha com o ser humano
inacabado, em processo).
8.
Qual o verdadeiro objetivo de uma avaliação?
Subsidiar
a construção dos melhores resultados possíveis dentro de uma determinada
situação. O ato de avaliar está a serviço dessa busca.
9.
Muito se fala da avaliação e de como o professor deve lidar com ela, mas muitas
vezes se esquece do aluno. Qual o verdadeiro valor da avaliação para o
estudante?
A
questão volta novamente ao mesmo lugar. Sua pergunta tem a ver com o conceito
de examinar. O ato de avaliar sempre inclui o estudante, pois que ele é o
agente de sua formação; só ele se forma. O papel do educador é acolher o
educando, subsidiá-lo em seus estudos e aprendizagens, confrontá-lo
reorientando-o em suas buscas.
10.
A sociedade ainda é muito "apegada" a notas, reprovação, escola fraca
ou forte. Como fica a relação com os pais acostumados com essas palavras quando
a escola utiliza outras formas de avaliação?
Assim
como os educadores, os pais foram educados em outras épocas e sob a égide dos
exames. Para que possam olhar para a educação de seus filhos com um outro olhar
necessitam de ser reeducados continuamente. Para isso, devem servir as reuniões
de pais e mestres, que usualmente tem servido quase que exclusivamente para
comentar como as crianças e adolescentes estão se desempenhando em seus
estudos. Por outro lado, o sistema de avaliação a ser apresentado para os pais
deve ser consistente. Por vezes, pode parecer que “avaliar” significa “qualquer
coisa”. Não é e não pode ser isso. Avaliar é um rigoroso processo de subsidiar
o crescimento dos educandos.
...
Para
desenvolver uma cultura da avaliação os educadores e a escola necessitam de
praticar a avaliação e essa prática realimentará novos estudos e
aprofundamentos de tal modo que um novo entendimento e um novo modo de ser vai
emergindo dentro de um espaço escolar. O que vai dar suporte à mudança é a
prática refletida, investigada.
Retirado do site de Cipriano Carlos Luckesi